terça-feira, 5 de abril de 2016

O INCRÍVEL RAPAZ COM GARRAS NOS PÉS


Guilherme, 4 anos, adora as suas unhas dos pés. São dele, são as suas garras. Na hora de as cortar chora furiosamente de uma forma descontrolada: “não quero, vai doer”. Mesmo depois de perceber pela experiência que não doeu, na vez seguinte ao tentar cortar as unhas tudo se repete.

Respira Mãe Catita.
Começo por deixar de tentar resolver o “problema” e tentar perceber o que está realmente em causa. Estou a respeitar e reconhecer a necessidade do meu filho? O que ele está a tentar comunicar? Respira Catita.

A Parentalidade Consciente usa algumas ferramentas que nos ajudam a perceber melhor as necessidades que os nossos filhos precisam de sentir preenchidas e que muitas vezes ficam perdidas no seu comportamento, que é o maior foco de outras formas de educação.
Um dos métodos que gosto de utilizar é o método LASEr do Pedro Vieira. Este método define 4 cores de personalidades-tipo às quais correspondem necessidades predominantes. Usando o método LASEr, descobri que o meu filho é verde (necessidade de conexão e pertença), vermelho (necessidade de reconhecimento e significância) em situações pontuais é bastante azul (necessidade de segurança e controlo). Neste caso, senti que através da conexão e do reconhecimento da sua opinião poderia encontrar uma forma de lhe dar controlo da situação.

Enquanto ele continua a berrar e a espernear, guardo a tesoura e procuro usar uma linguagem pessoal para comunicar de uma forma consciente com ele. Tento ouvi-lo e não apenas ouvir para arranjar maneira de lhe cortar as unhas.

“Guilherme, a mamã quer falar contigo, já vi que estás muito zangado. Podes olhar para os meus olhos por favor? Gosto de falar contigo quando olhas para mim, assim sei que estás a ver o que estou a sentir e eu também vejo o que tu estás a sentir” (ainda chorar sentou-se ao meu lado, abracei-o).



“ - Vejo que ficas muito zangado e nervoso na altura de cortar as unhas dos pés, não é? Porquê?

-       Vai doer. As unhas são pequeninas, vai doer muito.

-       As das mãos também doem?

-       Não. Estas é que são pequeninas.

-       Hum?! Então o que custa são mesmo as dos pés?

-       Sim...

-       Eu percebo. Também gosto mais de cortar as unhas das mãos.

Eu preciso mesmo de te cortar as unhas dos pés, elas estão muito grandes e podem magoar-te. Fico preocupada por estarem assim tão grandes.

O que achas que podemos fazer para não te custar tanto? Tens alguma ideia?

-       Deixa-me pensar.. Podíamos fazer legos...

-       Boa ideia, assim já não vai doer?

-       E jogar no Ipad! Não mamã, assim não. Assim é cósmico.

Durante a comunicação consciente procurei reconhecer o que ele estava a sentir, confirmar esse sentimento e dar espaço e apoio para ele encontrar a sua solução.

É mais fácil agarramo-nos ao pensamento que julga ”que disparate, agora tem medo de cortar as unhas dos pés” ou ao “cortas e acabou a choradeira”.
É mais desafiante sentir porque é que me incomoda ele não fazer o que eu quero. Questionar a diferença entre o que quero e qual a minha intenção. Aceitar que o Guilherme é uma pessoa inteira, com o mesmo valor que eu e cujas emoções são tão válidas e importantes quanto as minhas.
É preciso largar o saco, este saco pesado que carregamos cheio de expectativas e pensamentos que muitas vezes nem eram nossos e que já não nos servem nem devem passar para os nossos filhos.
Aceitar. Eu também tenho medo. E gostava mesmo que me tivessem perguntado “O que achas que podemos fazer para não te custar tanto? Tens alguma ideia?” ...sabia tão bem essa pergunta. Sabia a “Eu vejo-te”, a “eu estou aqui contigo e gosto muito de ti como tu és, com todos os teus medos e emoções”. A sentir que a minha integridade física é importante, e que o meu corpo é meu até à pontinha das unhas dos pés.
Através desta situação, tive a oportunidade maravilhosa de conhecer mais um pouco o meu filho, de regar a sua autoestima, de aumentar a nossa ligação e confiança. De usar a minha mente de principiante para olhar pela primeira vez para a situação de cortar as unhas dos pés e o meu detective-mamã para descobrir as necessidades em falta. Percebi que ele tem uma grande necessidade de pertencer em todos os processos, de ser ouvido, de ter algo a dizer para se conseguir sentir seguro.
É incrível o meu rapaz com garras nos pés.

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