Guilherme, 4 anos, adora as suas unhas dos pés. São dele,
são as suas garras. Na hora de as cortar chora furiosamente de uma forma
descontrolada: “não quero, vai doer”.
Mesmo depois de perceber pela experiência que não doeu, na vez seguinte ao
tentar cortar as unhas tudo se repete.
Respira Mãe Catita.
Começo por deixar de tentar resolver o “problema” e tentar
perceber o que está realmente em causa. Estou a respeitar e reconhecer a
necessidade do meu filho? O que ele está a tentar comunicar? Respira Catita.
A Parentalidade Consciente usa algumas ferramentas que
nos ajudam a perceber melhor as necessidades que os nossos filhos precisam de
sentir preenchidas e que muitas vezes ficam perdidas no seu comportamento, que
é o maior foco de outras formas de educação.
Um dos métodos que gosto de utilizar é o método LASEr do
Pedro Vieira. Este método define 4 cores de personalidades-tipo às quais
correspondem necessidades predominantes. Usando o método LASEr, descobri que o
meu filho é verde (necessidade de conexão e pertença), vermelho (necessidade de
reconhecimento e significância) em situações pontuais é bastante azul (necessidade
de segurança e controlo). Neste caso, senti que através da conexão e do reconhecimento
da sua opinião poderia encontrar uma forma de lhe dar controlo da situação.
Enquanto ele continua a berrar e a espernear, guardo a
tesoura e procuro usar uma linguagem pessoal para comunicar de uma forma
consciente com ele. Tento ouvi-lo e não apenas ouvir para arranjar maneira de
lhe cortar as unhas.
“Guilherme, a mamã quer falar contigo, já vi que estás
muito zangado. Podes olhar para os meus olhos por favor? Gosto de falar contigo
quando olhas para mim, assim sei que estás a ver o que estou a sentir e eu também
vejo o que tu estás a sentir” (ainda chorar sentou-se ao meu lado, abracei-o).
“ - Vejo que ficas muito zangado e nervoso na altura de
cortar as unhas dos pés, não é? Porquê?
-
Vai doer. As unhas são
pequeninas, vai doer muito.
-
As das mãos também doem?
-
Não. Estas é que são
pequeninas.
-
Hum?! Então o que custa são
mesmo as dos pés?
-
Sim...
-
Eu percebo. Também gosto mais
de cortar as unhas das mãos.
Eu preciso mesmo de te cortar
as unhas dos pés, elas estão muito grandes e podem magoar-te. Fico preocupada por
estarem assim tão grandes.
O que achas que podemos fazer
para não te custar tanto? Tens alguma ideia?
-
Deixa-me pensar.. Podíamos
fazer legos...
-
Boa ideia, assim já não vai
doer?
-
E jogar no Ipad! Não mamã,
assim não. Assim é cósmico.
Durante a comunicação consciente procurei reconhecer o
que ele estava a sentir, confirmar esse sentimento e dar espaço e apoio para
ele encontrar a sua solução.
É mais fácil agarramo-nos ao pensamento que julga ”que disparate, agora tem
medo de cortar as unhas dos pés” ou ao “cortas e acabou a choradeira”.
É mais desafiante sentir porque é que me incomoda ele não fazer o que eu
quero. Questionar a diferença entre o que quero e qual a minha intenção. Aceitar
que o Guilherme é uma pessoa inteira, com o mesmo valor que eu e cujas emoções
são tão válidas e importantes quanto as minhas.
É preciso largar o saco, este saco pesado que carregamos cheio de expectativas
e pensamentos que muitas vezes nem eram nossos e que já não nos servem nem
devem passar para os nossos filhos.
Aceitar. Eu também tenho medo. E gostava mesmo que me tivessem perguntado
“O que achas que podemos fazer para não te custar tanto? Tens alguma ideia?” ...sabia
tão bem essa pergunta. Sabia a “Eu vejo-te”, a “eu estou aqui contigo e gosto
muito de ti como tu és, com todos os teus medos e emoções”. A sentir que a
minha integridade física é importante, e que o meu corpo é meu até à pontinha
das unhas dos pés.
Através desta situação, tive a oportunidade maravilhosa
de conhecer mais um pouco o meu filho, de regar a sua autoestima, de aumentar a
nossa ligação e confiança. De usar a minha mente de principiante para olhar
pela primeira vez para a situação de cortar as unhas dos pés e o meu
detective-mamã para descobrir as necessidades em falta. Percebi que ele tem uma
grande necessidade de pertencer em todos os processos, de ser ouvido, de ter
algo a dizer para se conseguir sentir seguro.
É incrível o meu rapaz com garras nos pés.
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